Imagine essa cena: a criança parece desatenta, não consegue se concentrar nas lições, se distrai com facilidade na escola e em casa, esquece onde colocou os brinquedos e tem dificuldades para respeitar regras ou limites. Antigamente, esse comportamento seria visto apenas como indisciplina e receberia um tratamento severo de pais e professores. Mas atualmente a criança pode ser diagnosticada com TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade), uma doença que atinge entre 3% e 5% da população. A boa notícia é que existe tratamento!
Como diagnosticar o problema?
A criança com TDAH é desatenta, incapaz de se concentrar, de prestar atenção (mesmo que faça esforço para tal), é avoada e distrai-se com facilidade, de acordo com o psiquiatra Mario Louzã, coordenador do projeto Déficit de Atenção e Hiperatividade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (FMUSP). “O mesmo acontece se for hiperativa, ela não consegue ficar sentada numa sala de aula ou em casa, durante uma refeição, fica o tempo todo se remexendo ou levantando da cadeira. Outro sintoma é a impulsividade, a criança muitas vezes é ‘descontrolada’, atrapalha as outras durante uma brincadeira, por exemplo”, explica.
O diagnóstico costuma ser realizado por volta dos 7 anos, porque nessa idade a diferença de comportamento, em comparação com outras crianças da mesma faixa etária, se torna mais clara. “As crianças sem TDAH já conseguem permanecer quietas e prestar atenção à professora, tendo condição de se controlarem em situações nas quais isso é exigido delas”, afirma Louzã.
Um dado importante é que, embora meninos e meninas apresentem o mesmo problema de desatenção, as meninas com TDAH são menos impulsivas e hiperativas, dificultando para pais e professores identificarem as garotas que sofrem com a doença.
Como a maioria das crianças tende a não parar quieta, a doença não é tão simples de ser constatada, precisando assim que um profissional observe a criança para ter certeza do problema. “Toda criança é um tanto inquieta ou desatenta, mas algumas têm um grau muito mais elevado que o observado em outras crianças da mesma idade. Portanto, o diagnóstico é clínico, com base em entrevista bem detalhada, que deve ser realizada por um profissional treinado, e baseado em critérios diagnósticos bem definidos, que são estabelecidos pela Associação Psiquiátrica Americana e pela Organização Mundial da Saúde”, esclarece a neuropediatra Cecília Guerreiro.
Remédios e terapia
Por ser um transtorno neurobiológico ligado a uma disfunção na região pré-frontal do cérebro, de origem genética, o TDAH é tratado com remédios, que devem ser associados à psicoterapia. O ideal é que pais e professores também recebam orientações sobre como lidar com a criança que apresenta o problema. “São usados medicamentos que, em conjunto, recebem o nome de psicoestimulantes. Os mais conhecidos são o metilfenidato e as anfetaminas. Há também alguns antidepressivos utilizados no tratamento”, esclarece Louzã. De acordo com Cecília Guerreiro, o metilfenidato é o único remédio específico no Brasil, no momento, e tem várias apresentações: uma de ação curta (cerca de 4 horas), que precisa ser administrada duas a três vezes ao dia, outra que dura 8 horas, e uma terceira que age durante 12 horas.
Mas apenas os remédios não resolvem o problema, embora os resultados possam ser percebidos rapidamente. “Uma vez introduzida a medicação e feito o ajustamento da dose, a criança é encaminhada para as abordagens psicossociais, que incluem a psicoterapia (chamada de ludoterapia, no caso das crianças), psicopedagogia, fonoaudiologia, etc., de acordo com cada caso”, afirma Louzã.
Texto de Tereza Guedes
Fontes: Mario Louzã é psiquiatra, doutor em Medicina pela Universidade de Würzburg (Alemanha), médico assistente e coordenador do projeto Déficit de Atenção e Hiperatividade (PRODATH) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (FMUSP);
Cecília Eugenia Simielli Guerreiro é neuropediatra com residência em neuropediatria infantil no Hospital de Clínicas de Ribeirão Preto e médica da Apae de Marília;
César de Moraes é psiquiatra com Pós-Doutorado em Neurologia pela Unicamp e professor assistente de Psiquiatria da PUC-Campinas.